Adolpho Bezerra de Menezes,
o médico dos pobres, contou que fora desafiado por um materialista de seu tempo
a um debate e que respondeu, aceitando tal convite, desde que aquele homem, o
desafiante, trouxesse até ele uma única pessoa que tivesse sido emocionalmente
beneficiada pelas teorias materialistas. Qualquer pessoa que já tivesse tido
suas dores amenizadas, seus anseios apaziguados através do niilismo.
Podemos, por outro lado, aventar
que existe um sentido no que vivemos, que a Existência tem um propósito bom,
justo e amoroso e que a dor não é um castigo, mas um convite. Muitos estudiosos
da ciência atual comentam que quando irrigamos nossos corações com as águas da
fé viva, quando abraçamos uma filosofia positiva, que traz Sentido e Esperança,
temos, por consequência, melhores índices de harmonia, de felicidade, e,
logicamente, menores índices de adoecimentos, muito menos depressão e tendências
ao suicídio. São questões protetivas ao Ser.
Seguindo essa linha de
pensamento, o Espiritismo se alinha às demais Tradições de Espiritualidade que
admitem a reencarnação como única possibilidade para explicarmos
as desigualdades e situações que nos causam estranhezas, com a possibilidade de
irmos além, com mais detalhes ditados pelos Espíritos, trazendo-nos maior coerência.
Na Doutrina compreendemos
que nenhuma família se forma, na Terra, de maneira aleatória. Antes, se agrupam
por necessidade dos Espíritos envolvidos, muita vez por amor, mas, em algumas
situações, por resgates devido a situações lamentáveis, de erros pregressos. Pais que recebem seus
filhos, vindos do Mundo Maior, tem enorme carga de responsabilidade diante
desta que é, sem dúvida, a maior de suas missões na Terra. Estes filhos recebem
seus corpos, cuidados, segurança, orientações e muito mais. Aprendemos que não
existe aleatoriedade e que estamos convivendo com aqueles que a Lei Divina nos
aproximou com vistas a evolução de cada um e do grupo, muita vez arrastando
dificuldades, desalinhos, mas também com sagradas oportunidades de reajustes,
perdão e amor.
Emmanuel começa o capítulo
38 de O Livro da Esperança (psicografia de Francisco Cândido Xavier) nos
convidando a uma reflexão sobre o versículo 19 do capítulo 19 de Mateus, quando
Jesus nos orienta a honrarmos nossos pais e mães, relembrando-nos o quinto
mandamento da Antiga Lei. Também destaca uma frase de Kardec, no capítulo 14,
item 3 do Evangelho Segundo o Espiritismo, em que o mestre lionês dá mais
alguns detalhes sobre o que seria honrar pai e mãe, tais como ajudá-los em suas
necessidades, tratá-los bem em sua velhice, cercá-los de cuidados...
No mesmo capítulo, mas no
item 9, Agostinho (Espírito) vai explicar que a ingratidão dos filhos é algo
abominável... e, na mesma mensagem, busca ajudar os pais a compreenderem estes
desafios que afetam tanto os corações, alertando para a realidade que muitos
filhos são seus credores antigos. Por vezes são almas que vem para que aconteçam
os ajustes, reconciliações e acertos, por conta de problemas em vidas anteriores.
Então ele diz aos pais:
tenham paciência. Peçam guiança a Deus. Mantenham a força do amor e saibam que
os esforços serão recompensados, pois o Amor é uma força irresistível e mesmo
que essas dificuldades sigam, por muito tempo, dia chega, em alguma vida se não
for nessa, em que as cascas caem, a raiva cessa, a gratidão chega...
Mas voltando nossa fala no
que tange os filhos, quando a impaciência, a raiva, as cobranças com relação
aos pais surge, cabe se perguntar: o que a criança que vive em mim tanto
reclama, tanto exige? O que de fato me faltou, nesta vida? Fui privado de afeto?
Fui privado de cuidados? Fui privado de respeito? Mesmo que tudo isso tenha se
dado, cabe-nos buscar o diamante no pântano: a vida que pulsa. Nossos pais nos
permitiram nascer. E, sabemos, a maior parte deles fez enorme esforço para que
a vida seguisse... noites de vigília, muito trabalho na manutenção material,
cuidados com segurança, etc. Isso é muito grande e importante para ser
esquecido. Podemos ter nossas dores, mas precisamos também pensar no amor que
se fez presente, em diversas linguagens.
Aceitar os pais é caminho
de paz e força. Repelir os pais é atacar a si mesmo, dizem os humanistas. Eles
estão dentro de nós...estejam bem ou mal encaixados.
Agora, retomando o
apontamento do Cristo, o que seria, então honrarmos pai e mãe? Além de sermos
gratos, o que está dentro do obvio, o que mais consistiria em honrá-los? Kardec
fala sobre os cuidados dentro da relação, o que também consiste no básico, se
pensarmos com a lente da gratidão... O que significa honrar, em seu sentido
mais profundo? Se perguntarmos a pais que são saudáveis sob o ponto de vista
psíquico e espiritual, pais que amam sem estarem eclipsados por suas próprias
feridas, dirão: “Sinto-me honrado, sinto-me honrada com quando meus filhos
fazem da sua vida uma vida de valor. Quando crescem, se desenvolvem, se tornam
mais humanos e responsáveis. Quando assumem suas vidas como um presente sagrado
que devem cuidar e usar, entregando seus talentos para si e para o mundo.
Quando, por fim, são felizes, dentro de suas possibilidades... encontrando
equilíbrio, mesmo diante dos desafios da Vida...” Porque na arte de serem
pais, tudo o que mais importa é saberem que seus filhos conseguiram aquilo que
aqui vieram aqui realizar, dentro e fora deles.
Isso seria honrar... isso
faz os pais se sentirem felizes e plenos em suas missões.
Agora, voltando ao texto de
Emmanuel, vamos ver que ele fala diretamente a estes pais que passam por dores
e dificuldades nas relações com seus filhos. Começa o texto explicando que a
Lei da reencarnação aproxima de nós nossos filhos, que são pérolas sagradas aos
nossos corações e que, por vezes, surgem dificuldades grandes, com cobranças, ataques,
evitações... filhos que desmerecem, desqualificam os pais.. e que essa dor é,
de fato, muito intensa, mas que devemos levar em conta de que pode ser que
sejam credores dentro do lar... são almas que vem em busca de reajustes e que
precisam do nosso amor.
Vejamos ainda o que
Emmanuel dita através de Chico: “Muitas vezes choras e sofres, tentando
adivinhar-lhes os pensamentos para que te percebam os testemunhos de amor. Calas
os próprios sonhos, para que os sonhos deles se realizem. Apagas-te, a pouco a
pouco, para que fuljam em teu lugar. Recebes todas as dores que te impõem à
alma, com sorrisos nos lábios, conquanto te amarfanhem o coração.
Quando te vejas, diante de
filhos crescidos e lúcidos, erguidos à condição de dolorosos problemas do
espírito, recorda que são eles credores do passado a te pedirem o resgate de
velhas contas. Busca auxiliá-los e sustentá-los com abnegação e ternura, ainda
que isso te custe todos os sacrifícios, porque, no justo instante em que a
consciência te afirme tudo haveres efetuado para enriquecê-los de educação e
trabalho, dignidade e alegria, terás conquistado em silêncio, o luminoso
certificado de tua própria libertação. fui lendo.”
Conforme lia este capítulo
de Emmanuel, lembrei-me do filme Big Fish, dirigido por Tim Burton. A
história de um pai e seu filho... Edward Button e Will...
O filho, até certa idade se encantava com as histórias que o pai
contava... mas depois, além de duvidar, começou a sentir raiva... não entendia,
culpava o pai por suas ausências, afastou-se... até que, quando Ed estava enfrentando
a própria finitude, Will foi chamado a estar junto de seu pai... e, só ali pode
perceber que ele sempre falou sobre verdades, mesmo que de maneira simbólica, mesmo
fantasiosa... que ensinava o filho com essas histórias. Era parte de sua
entrega a ele... Só alí, no momento da morte do pai, Will conseguiu compreender
e se perceber muito amado por Edward...e saber do quanto este pai foi especial
a tantos outros, no mundo... Pôde compreender e liberar as mágoas que guardava.
O filme é um convite a
olharmos para nossas relações, de pais e filhos... O momento que ambos os
personagens partilham, não só valida o amor do Will pelo pai, mas também mostra
que o seu filho agora entende o que o pai sempre tentou dar-lhe.
Aliás, conta-se que o
próprio Tim Burton estava ali falando da relação dele com seu pai...
Por fim, acredito que
conseguimos um viver muito mais leve e equilibrado quando criamos um ambiente
de paz e respeito no lar. Esta é uma das maiores bençãos nessa Vida.
Mesmo que não possamos
estar próximos, que em nossos corações nossos pais e filhos tenham sempre um
lugar de honra e amor!
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Baseado no cap. 38 de O Livro da Esperança;
No Evangelho de Mateus, cap 19, versículo 19 e no cap.
14 do Evangelho Segundo o Espiritismo, itens 3 e 9.